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Domingo, 22 Dezembro 2024
Paulo Barros
Paulo Barros
Economista famalicense.

Tony 1 – IMI 0

O orçamento das Antoninas foi de quase um milhão de euros. Bem acima da média do que gastam os concelhos vizinhos.

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Paulo Barros
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Economista famalicense.

Famalicão

Maio é o mês das cerejas, e das flores, e de Maria. Um mês de temperança que se segue às chuvas mil, e que acompanha a subida de temperatura, os dias que começam a estender-se noite dentro. Sentimos o resfolegar da primavera mesmo às portas dos Santos e das promessas do verão que se avizinha.

Inconvenientemente, é também o mês do IMI.

Estão a ver aquela cartinha singela, em formato oficial, com picotado nas laterais, que (muitos de nós) recebemos no mês de Maio? Pois é isso, é o IMI. Nunca falha.

Não sou dos que choram cada cêntimo pago em impostos. Compreendo a função social e defendo o carácter progressivo do esforço fiscal. Mas para o IMI tenho pouca paciência, digo já. E não é por recair sobre a propriedade, visto que também ela acarreta despesas ao erário publico: a recolha de lixo, a limpeza das ruas, a instalação e manutenção da rede de águas e saneamento, etc., etc., etc.

Se não gosto particularmente do IMI é apenas por ser, por excelência, o imposto dos sonsos. Não me refiro a nós, contribuintes dedicados; refiro-me aos autarcas deste país. Porque funciona assim: quem fica com o ónus social da cobrança do IMI é o Estado Central, esse malvado sorvedor de riqueza; já a colecta reverte para as autarquias, o bom-serás das populações esbulhadas pelo fisco. Bom negócio.

(Antigamente ainda se chamava contribuição autárquica e aí não haveria quem pudesse desconhecer o fim do dinheiro. Mas agora assim, com um nome destes… e quem diz que não foi de propósito?)

É bem sabido que os autarcas estão sempre prontos a envergar a fatiota do Super-Calimero quando lhes vêm cobrar responsabilidades. Uma narrativa a três tempos:

  1. Logo a eles, que são pequeninhos?
  2. Então eles, que vivem afogados num mar de necessidades?
  3. E por último (este nunca falha), haverá muito por onde escarafunchar nas tenebrosas dependências no Estado Central antes de lhes virem tocar à porta. (uma variante daquele vetusto argumento, «roubo, mas pouco»)

E se não cola logo de início, repetem-se ad nauseum, porque o argumento funciona em circuito fechado com o beneplácito dos poderes fáticos da sociedade, que lá dos seus gabinetes com vista para o mundo olham para os autarcas com olhos lassos (prenhes de ironias e cansaços). E assim lá vão eles, os autarcas, pelo meio dos pingos da chuva da sua irresponsabilidade. Logo eles, que são tão pequeninhos. E que vivem afogados num mar de necessidades…

Alguns serão pequeninos, não discuto. No caso de Famalicão, façam o favor de tomar nota: só em IMI a receita anual ronda os 16 Mi EUR. Dá para muito «desenvolvimento estrutural».

Tenho, porém, uma má notícia para dar. É que são as autarquias quem, em grande medida, determina as taxas de IMI a cobrar no seu concelho. Funciona assim: para os prédios rústicos não determina, a taxa está fixada em 0,8%. Mas para os prédios urbanos, sim, determina. Dentro de uma margem de variação, bem entendido: pode aplicar desde a taxa mínima de 0,3% até à taxa máxima de 0,45% do valor patrimonial.

Ora, acharia o comum mortal que o município de Famalicão andasse pelos mínimos dos mínimos: afinal, como não se cansam de nos dizer, estamos a falar do concelho que é o terceiro maior exportador nacional. Uma ilha de prosperidade, portanto.

Só que não: em Famalicão a dita taxa está fixada em 0,34%. Verdade que está mais próxima do mínimo do que do máximo: também só 5 concelhos em 308 aplicam os 0,45%. E quantos aplicam o mínimo de 0,3%, já agora? São 193.

Recapitulando: em 2024, de 308 municípios (na verdade 303, pois para 5 deles não foram divulgados dados), 193 cobram a taxa mínima de 0,3% no IMI para prédios urbanos. Já Famalicão cobra 0,34%. Não está mal, quando pensamos que quem protagoniza esta política no concelho são justamente aqueles que peroram continuamente sobre o imperativo de fazer baixar a carga fiscal dos portugueses.

Tenho estado a falar do nosso bolso. Parece-lhe pouco, 40 euros a cada 100.000? Depende de cada um, e não serei eu a contestar uns e outros. Até porque a questão não está tanto no dinheiro que se cobra, mas sim no que se faz com ele. Que é onde quero chegar, precisamente. Continuemos então a falar mais um pouco sobre o nosso bolso.

Corria o ano de 2022, o contexto era de inflação alta, e o país conheceu um movimento pela redução das taxas de IMI. Nesse ano, 46 autarquias reduziram as taxas. Em Famalicão, a oposição propôs que a taxa passasse para o mínimo legal de 0,3%. O actual executivo recusou: foi quando baixou a taxa de 0,35% para os actuais 0,34%. Argumento: seria uma irresponsabilidade fazê-lo porque colocava em causa o “desenvolvimento sustentável do concelho”.

[desenvolvimento sustentável: nunca duas palavras foram tão em vão invocadas, tantas vezes, por tanta gente]

Nota: o Sr. Mário Passos gabou-se há bem pouco tempo de gerir um orçamento de 170 milhões de euros, donde se tira que a receita anual do município em IMI ronda 10% disso.

E para quê? Bom, para uma coisa serviu: o orçamento deste ano das Antoninas aumentou 40% face ao ano anterior. Foi de quase um milhão de euros. Bem acima da média do que gastam os concelhos vizinhos (se bem que nenhum deles é o terceiro maior exportador nacional). Esta estratégia tem um nome: pão e circo.

Em suma: os tais 40 euros doer-me-iam menos se fosse aplicados a melhorar a eficácia dos serviços administrativos da câmara, isto é (mero exemplo): se uma mísera licença de urbanismo não custasse meses e anos a sair; se a recolha do lixo fosse mais regular e já agora homogénea em todas as partes do concelho; se não fossem usados para caprichos de promoção pessoal, para favorecimentos na contratação de amigos e familiares, para candidaturas estapafúrdias a capitais europeias de coisas para as quais o concelho está absolutamente desqualificado. Por fim, para condicionar e intimidar todos quantos combatam esta visão sectária e mesquinha do dito “desenvolvimento sustentável”, que se traduz numa lógica predatória dos recursos do território.

Não é difícil, mas não com esta gente. A culpa nem é tanto deles, porque não dão para mais: pão e circo. A culpa é nossa que os pusemos lá. E se os mantivermos lá, pior ainda.

É que para pão e circo ando eu fartinho de dar o meu dinheiro.

 

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