As associações estão para o poder político local, como o peixe-palhaço está para a anémona-do-mar, ou seja, vivem numa relação, que é conhecida em biologia, por mutualismo. O peixe-palhaço é protegido pela anémona-do-mar que assim, consegue sobreviver mais facilmente, e a anémona também ganha pela atração das presas por parte do peixe-palhaço. Sendo esta relação claramente benéfica para ambas as partes, no caso da gestão municipal, ela não é obrigatória nem desejável, já que sai muito cara aos contribuintes.
Vou explicar: as reuniões do executivo municipal, são ocupadas, maioritariamente, por decisões sobre atribuições de subsídios ao movimento associativo local.
Há na sociedade portuguesa, uma cultura doentia e prejudicial ao desenvolvimento individual e coletivo, de subsídio-dependência, que foi promovida e incentivada, por razões ideológicas, após 25 de abril. Criou-se a ideia de que o Estado serve para resolver todas as necessidades dos cidadãos e mais do que isso, também deve dar respostas às suas vontades. Imagino que para os decisores municipais, esta situação não seja muito estimulante, do ponto de vista intelectual. Mas a verdade é que este exercício de distribuir subsídios é bom para ambas as partes, para quem pede e para quem dá, mas é péssima para quem paga.
Quem cria e gera o dinheiro que vai ser utilizado em subsídios que a Câmara distribui, são maioritariamente os contribuintes famalicenses. Só para termos uma ideia, a autarquia distribui por ano, cerca de 7 milhões de euros pelas associações, o que corresponde a mais de 20% do valor dos impostos municipais. E esta é a razão porque a Câmara Municipal(CM) não quer diminuir significativamente o IRS, o IMI e a Derrama Municipal. Claro que existem outras rúbricas de despesa questionáveis, como sejam a “Aquisição de Bens e Serviços”, nomeadamente os trabalhos especializados e avenças, que já somam oito milhões de euros. Mas isso ficará para uma próxima reflexão.
Chegados aqui, todos compreenderam muito bem por que existe a tal relação de “mutualismo político” entre as associações e o poder instituído, com prejuízo dos pagadores de impostos. Se o executivo municipal baixasse os impostos (no caso do IRS, está nos 4,5%, mas poderia ser zero), deixaria de ter disponibilidade financeira para responder às clientelas associativas. E são centenas de associações que movimentam milhares de eleitores, apenas nos seus órgãos sociais.
Uma gestão autárquica liberal, iria num primeiro momento baixar os impostos municipais e a partir daí fazer uma análise rigorosa da atividade associativa, separando aquilo que é atividade essencial (proteção civil, apoio social, etc.) de outras atividades, que sendo importantes para a comunidade local, não são essenciais, como por exemplo, a realização de festas e festinhas.
Há várias associações no concelho que recebem anualmente dezenas de milhares de euros (dos nossos impostos) sem que se conheça atividade relevante. Vão ao portal da Câmara Municipal (penso que agora já não estão os apoios de 2018 e 2019) e vejam a quantidade de subsídios de milhares de euros que são atribuídos e verifiquem se conhecem ou ouviram notícias sobre as atividades relevantes dessas mesmas associações. Todas as associações que recebem dinheiros públicos, tem o dever de publicitar esse apoio e até de agradecer aos contribuintes, que suportaram com os seus impostos, aqueles apoios.
Lembram-se de há uns anos atrás, ter aparecido na praça pública, o caso das “Raríssimas”, por causa da gestão faustosa e, simultaneamente, danosa, da sua presidente e das relações promíscuas da associação com alguns governantes? Eu não sei se no nosso concelho existe alguma situação semelhante. Espero, sinceramente, que não. Contudo, assisto a algumas reuniões da Câmara Municipal e verifico muitas escusas por parte de elementos do Executivo Municipal em participar nas votações de algumas decisões, relacionadas com a atribuição de subsídios para as associações, o que confirma a existência de conflito de interesses.
A Câmara Municipal, ao dar a todas as novas associações que são criadas, um cheque de 250€, sem estas fazerem o que quer que seja, está a dar um sinal errado e a arriscar a “estoirar” milhares de euros anuais, caso essas associações não tenham qualquer atividade.
Não existe dinheiro público, o que há são impostos que são entregues aos gestores autárquicos, para estes lhe fazerem bom uso, sendo fiéis depositários desses valores, que foram ganhos com muito esforço dos contribuintes e, por isso, merecem um cuidado muito especial na sua utilização. O dinheiro que a Câmara Municipal dispõe não é propriedade do presidente ou dos vereadores, mas é o resultado do trabalho e do esforço diário de milhares de contribuintes. Mesmo a associação mais insuspeita, deve prestar contas sobre a forma como gastou o dinheiro que é de todos, não só ao Executivo e à Assembleia Municipal, como ao público em geral. Nunca sabemos se os corpos sociais das associações estão à altura das suas responsabilidades.
Ao nível dos subsídios que são dados a tudo o que mexe ou ainda está parado, é visível a forma indiscriminada como se apoia tudo o que é festa e festinha, qualquer atividade desportiva ou religiosa, sem qualquer relevância para a comunidade, em geral.
No que diz respeito aos apoios públicos que o Estado concede, por exemplo, através da consignação de 0,5% do IRS às entidades sem fins lucrativos, penso que é uma forma correta e adequada de apoiar as associações. E é a sociedade civil que decide quem deve apoiar. As restantes, se são tão importantes para a comunidade, devem ser os seus beneficiários a arranjar maneira de custear as suas atividades, angariando donativos para tal e, não colocar-se na dependência do poder local, que mais não faz do que tirar aos contribuintes para distribuir pelas “clientelas do voto”, subsídio-dependentes.
Claro que não incluo todas as associações no “mesmo saco”, até porque há associações, que prestam serviços essenciais e por isso tem de ser financiadas por dinheiros públicos, sejam por via do orçamento do estado ou, por via do orçamento municipal. Em última análise, até posso admitir o reforço de apoio para aquelas associações que são essenciais e bem geridas. Mas tal só será possível quando formos exigentes e rigorosos nos restantes apoios concedidos.
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