“Ignorância estratégica é a habilidade
de explorar o desconhecimento para ganhar mais poder.”
McGoey (socióloga)
No próximo dia 26 de Setembro completamos um ano sobre a data das últimas eleições autárquicas. Tendo em conta os dados do Ministério da Administração Interna, 43.590 (36.5%) famalicenses não foram votar. Este é um número superior aos votantes na coligação vencedora da eleição à Câmara Municipal: 40.143. Conclusão, o governo deste Município resultou da escolha dos 33,6% de famalicenses com direito a votar.
Nesse 26 de Setembro de 2021, quase 70% dos famalicenses não escolheu esta equipa governativa que decide o futuro do concelho há mais de 20 anos. Isso, no mínimo, obrigaria a um esforço de transparência, abertura e discussão alargada dos grandes projectos e empreitadas que, já nessa altura, residiam ou entravam nos corredores da Câmara Municipal.
Passados 10 meses sobre a data das eleições, percebemos que afinal o programa da coligação, feito de frases bonitas e conceitos modernos como “sustentabilidade”, “ecologia”, “inclusão” e possivelmente “empoderamento” e “stakeholders”… escondia a perpetuação do estaleiro em que se transformou Famalicão.
Qualquer semelhança com Mordor e a personagem Gollum (Smeagel) do Senhor dos Anéis não é mera coincidência. Esta personagem vivia atormentada pela vontade de possuir o Anel (símbolo e objecto do poder) à semelhança do nosso Município que se encontra enfeitiçado pela poderosa “máquina” da construção civil e obras públicas.
Ora vejamos alguns factos: logo em Janeiro estávamos a discutir a urbanização da área do Tribunal. Entretanto ficamos a saber que temos uma série de projectos de produção de energia fotovoltaica na “via verde”. Em Barrimau, junto ao Pelhe, preparam-se as coisas para abrir mais umas ruas, mais uma urbanização e lá no meio ficará o putativo mini campo de golf.
Agora, e de mansinho, lá vem mais uma operação urbanística lá para o lado do Auchan. A decisão vem suportada em documentação cheia de cláusulas e contrapartidas. Conteúdos longos e complicados (obra de advogado), para não se perceber o que vem a caminho.
Mesmo assim, lá no meio, lê-se que se abdicam de potenciais zonas verde e equipamentos (porque do outro lado da estrada temos a Devesa). Ficamos a saber que vamos ter mais obras nas “vias de acesso”, ou seja, mais ruas, ou ruas mais largas, mais carros, mais confusão e mais CO2.
Só esta nota: no início deste mês foi criada pelo Município uma comissão para acompanhar as alterações climáticas e, pelo que se vê, essa comissão vai continuar esse acompanhamento durante os muitos anos em que se mantiver esta política.
Mas afinal o que vai nascer ali? Quantas lojas? Qual o volume de construção e que percentagem de solo ficará impermeabilizado? E já agora, será que valor das contrapartidas pagas pelo Auchan suporta os custos das obras previstas? Será que foram salvaguardados os interesses do comércio tradicional?
Os economistas dizem que não existem almoços grátis. Há sempre uma contrapartida. O Município destaca o que recebe, sem clarificar do que teve de abrir mão.
Estas questões dariam matéria para boas discussões durante a campanha eleitoral. Mas, não. Optou-se por esconder “estrategicamente” o jogo.
É chato discutir, é difícil ouvir e é preciso coragem para assumir as decisões depois de clarificar quem ganha e quem perde com as resoluções. É mais fácil fazer a coisa pela calada, de fininho, e continuar a responder aos interesses instalados. Infelizmente, esta é a semente da descredibilização do sistema.
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