A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) arquivou um processo que teve origem numa queixa apresentada por Mário Passos, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, contra o jornal NOTÍCIAS DE FAMALICÃO.
Na origem do processo, a notícia “Mário Passos faz viagem secreta a Lisboa para defender projeto imobiliário em reserva ecológica” publicada no dia 30 de agosto de 2023. No dia seguinte, na reunião do executivo municipal, Mário Passos anunciou que iria apresentar queixa-crime contra o jornal.
No fim da reunião, em declarações à comunicação social, o autarca lançou diversos ataques ao NOTÍCIAS DE FAMALICÃO tendo afirmado, entre outras coisas, que o jornal “se dedica a maledicência e a falsidade”. No entanto, como o jornal sublinhou na defesa apresentada à ERC, “o queixoso não desmente uma única afirmação da notícia de que se queixa”.
O Presidente da Câmara Municipal queixou-se, entre outros aspetos, do título da notícia, especialmente da expressão “viagem secreta”. A ERC salienta que “tal informação é contextualizada no corpo da notícia”. “O texto da notícia fundamenta a interpretação que origina a conclusão plasmada no título”, considera a ERC.
“A matéria noticiada, bem como a atuação do queixoso, pela natureza das suas funções inerentes ao cargo que ocupa, revestem-se de interesse público”
A ERC refere que “no caso em apreço a análise permitiu verificar que grande parte das informações avançadas na notícia são sustentadas numa fonte de informação documental”. A decisão da entidade reguladora destaca ainda que “importa também referir que a notícia descreve factualmente a informação”.
Quanto à alegação de Mário Passos de não ter sido contactado pelo jornal para o exercício do contraditório, a ERC refere que “é dever dos jornalistas procurar ouvir as partes com interesses atendíveis na matéria, como seria o caso do queixoso”, mas que, “no entanto, não se poderá deixar de atender ao argumento trazido pelo NOTÍCIAS DE FAMALICÃO – e que não foi contestado pelo queixoso – de que o gabinete de comunicação do executivo camarário não presta declarações ao jornal desde finais de 2022”. Aliás, face a sucessivas perguntas sobre os mais variados assuntos sem resposta o NOTÍCIAS DE FAMALICÃO, em maio de 2023, apresentou uma queixa contra a Câmara Municipal de Famalicão junto da ERC, que aguarda resolução.
“O escrutínio público da atividade dos titulares de cargos públicos pode ser especialmente relevante na política local”
A ERC sublinha ainda que “a recusa de alguma pessoa ou instituição em prestar declarações aos órgãos de comunicação é da responsabilidade daqueles e nunca poderia obstar à divulgação das matérias jornalísticas de interesse público, sob pena de colocar em crise os direitos de informar e ser informado previstos na Constituição”.
“A matéria noticiada, bem como a atuação do queixoso, pela natureza das suas funções inerentes ao cargo que ocupa, revestem-se de interesse público”, considera a ERC, que salienta que “cabe ao jornalismo um importante papel de escrutínio nas sociedades democráticas”.
“Esta função de escrutínio público das matérias relevantes para a comunidade e para a democracia, nomeadamente perscrutando a atividade dos titulares de cargos públicos, em cumprimento do direito à informação dos cidadãos, pode ser especialmente relevante na política local”, destaca a ERC.
“A imprensa regional, em muitos casos, debate-se com grandes dificuldades económicas e de acesso à informação quando não pauta a sua produção informativa pela agenda dos ocupantes do poder autárquico, que confundem os seus interesses e vinganças pessoais com os interesses do município e dos munícipes, desprezando a liberdade de expressão e de informação”
Na queixa apresentada à ERC, Mário Passos reforçou que também apresentou uma queixa-crime contra o NOTÍCIAS DE FAMALICÃO.
Na sua argumentação, a defesa do NOTÍCIAS DE FAMALICÃO, que neste processo foi representado pelo advogado Francisco Teixeira da Mota, lamentou “o comportamento abusivo de Mário de Sousa Passos, na sua qualidade de presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão que, com a presente queixa e um processo crime que anunciou já ter apresentado, mais não faz do que obedecer ao padrão das ações contra a participação pública em que a intenção não é a condenação das pessoas visadas, mas sim de as dissuadir de participarem na vida pública; a intenção é a destruição e o desgaste das pessoas (em particular dos jornalistas)”.
O advogado do NOTÍCIAS DE FAMALICÃO, que é especialista em questões relativas à liberdade de expressão e aos direitos humanos, destacou que “a imprensa regional, em muitos casos, debate-se com grandes dificuldades económicas e de acesso à informação quando não pauta a sua produção informativa pela agenda dos ocupantes do poder autárquico, que confundem os seus interesses e vinganças pessoais com os interesses do município e dos munícipes, desprezando a liberdade de expressão e de informação”.
Para ler a decisão na íntegra clique aqui.
Comentários