Podia estar quietinho e não escrever estas palavras agridoces e besuntadas de raiva que, desde sempre, atormentam o meu espírito desassossegado e fingidor, como alguém que caiu no planeta Terra de pé atrás, quase como um extraterrestre ou alienígena, sem saber como ou porquê, para além de nascer sem ser consultado e, pior, ter que tomar lugar, a qualquer momento, na barca de Caronte, ignorando completamente o destino para onde irá seguidamente a minha “anima”, invisível como todas, a não ser que a iluminada Beatriz me conduza para onde espero.
Alguém no mundo foi visitado por algum parente ou amigo que tenha desaparecido se nem sequer sabemos ainda o tamanho do universo e quando começou?!…
A verdade deve andar por aí escondida ainda entre as estrelas e aguardo com alguma esperança os resultados que a Humanidade espera pelo telescópio James Web já em órbita. Parece que não há relatos nem das agências espaciais nem de qualquer cibernauta celestial, apesar de estarmos a falar de muitos, muitos biliões de seres humanos, naturalmente, ao longo de todos os tempos.
Claro que as explicações para este feixe de problemas que a todos se coloca em alguma fase da existência podem ser muitas ou nenhuma, seja letrado ou analfabeto, bastando ter nascido aqui, ali ou acolá para além do tempo histórico pois que, como escreveu Ortega e Gasset, “O Homem é o Homem e as suas circunstâncias”, como que replicando o que já tinha sido registado por Abdera, na antiguidade grega, com a frase “O Homem é a medida de todas as coisas”.
Começo por ignorá-las a todas, sem exceção, apesar de algumas delas serem, a meu ver, mais convincentes que outras, pelo menos, por ter nascido neste cotovelo periférico da Europa, longe de Pretória, Vladivostok, Pequim ou Washington, pois que poderão ser bem paradoxais por esses afastados lugares e outras teorias, para além de ser muito diferente andar por cá em tempos de pré-história, do neandertal e Egipto antigo ou hoje.
Este velho Mundo já provou à saciedade que não serve e devia dar origem a um outro, qual fénix renascida, baseado nas leis e no respeito mútuo, colaboração e códigos éticos, para que não se apresentasse tão injusto e desigual.
Toda a linguagem, mesmo através do tambor no sertão, cortina de fumos ou mesmo rugido de leão, visa o entendimento e a comunicação de uma mensagem e será simples e corrente a linguagem que utilizarei neste grito de Ícaro já que, para além de um terço da população mundial ser analfabeta, certas novas tecnologias estão a silenciar, por diversas razões, tudo e todos, encaixotados e armazenados que estão os livros em bibliotecas que, a meu ver, desde Alexandria e Londres, Otava e Coimbra, constituem o cânone dos saberes de todos os tempos ao alcance da mão, continuando a inspirar-nos e a orientar os grandes caminhos da história da Humanidade.
Este velho Mundo já provou à saciedade que não serve e devia dar origem a um outro, qual fénix renascida, baseado nas leis e no respeito mútuo, colaboração e códigos éticos, para que não se apresentasse tão injusto e desigual e todos os seres vivos tivessem acesso à mesa e a tudo o mais que isso implica para que a existência dos mortais tivesse algum sentido de sonho, plenitude e realização pessoal.
Não sei quem o fez, nem se há outros mundos habitados, mas, tendo chegado a aventura humana ao ponto a que chegou por forma a querer mesmo saber se há lunáticos e marcianos em vez de acabar com as guerras, a pobreza e doenças universais, não se entende o porquê de tudo terminar assim, tragicamente, podendo haver outras maneiras bem diferentes de acabar a obra e ter outra finalidade esta paixão quase inútil que é, afinal, a existência.
O mais doloroso de tudo isto é ter conhecimento e saber dos milhões de crianças e seres humanos que aqui aparecem sem qualquer esperança em desfolhar uma existência decente e com um mínimo de metas e objetivos em tudo semelhante à capacidade de poder começar…
Ainda agora, e em cima do Natal, a UNICEF anunciou haver neste momento mais de 100 milhões de crianças em alto risco. Não fora a ganância quase mórbida e a rançosa presúria de um pequeníssimo bando de milionários burgessos e oligarcas cúmplices que parecem respeitar o seu deus Midas mas adorar mais o seu dinheiro e tudo poderia ser diferente e daqui as utopias e sistemas ditos socialistas e personalistas que afirmam que põem a pessoa em primeiro lugar e os circuitos produtivos e a riqueza social, quero dizer, sem ditadura do capital ou do trabalho, e tudo poderia bem ser possível de forma concreta e fácil. Porém, como escreveu Hobbes há séculos, “o homem é o lobo do homem…” e está quase tudo meridianamente explicado, para além de todos sabermos ser o ser humano capaz das mais excelsas virtudes e das piores baixezas…
A ONU é apenas uma miragem de boa vontade, mas não pode nem tem meios legais ou financeiros para tudo.
E não adianta mesmo tecer aqui um rol de considerações de índole cosmogónica ou filosófica para imaginar como e quando tudo isto começou e porque assim é, pois que, segundo as últimas investigações, conhecemos apenas 5% do vasto espaço galático do universo que não nos deixa de surpreender. Ele que conta mais de 13,82 biliões de anos de existência, mais do dobro do irmão Sol e da Terra, segundo informações atualizadas do satélite Planck.
A ONU é apenas uma miragem de boa vontade, mas não pode nem tem meios legais ou financeiros para tudo. Os países são um total disparate em termos de tamanho e regimes e o ferrete da escravatura e as nódoas do colonialismo vagueiam ainda por aí.
Temos os continentes que temos nas suas modernas reconfigurações porque a Pangeia não suportou por mais tempo os pontos mais extremados e nenhum país deveria poder abrir guerra contra países de outros continentes. Penso na China ou Rússia e EUA ou Canadá, Brasil e Índia e nas pequenas ilhas que são países e que dão uma ideia muito aproximada da ingovernabilidade de grande parte por muitas razões.
A guerra deveria ser simplesmente banida e reprovável para que todas as outras formas de poder se revelassem e pudessem funcionar. Um país da zona fria é diferente de um tropical e as leis têm que ser ajustadas ao país/território e modus Vivendi, sendo claro que há leis universais e o bom senso continua, de longe, a não ser a prerrogativa mais bem distribuída deste mundo, como pretendia o racionalista e autor do “Discurso do Método”.
Uma coisa deveria ser certa e dada como adquirida universalmente: o direito à liberdade total e à vida selvagem em todos os espaços do planeta, agindo-se com planeamento e rigor na justa definição dos objetivos próprios de cada família e país.
Pensemos só no desperdício escandaloso existente e em que seria tão fácil a todos alimentar se os homens em vez da guerra e da ganância, se empenhassem na paz, cooperação, diálogo e solidariedade.
Uma criança deveria poder saber que tem um futuro em liberdade à sua frente, sem recuos nem desvios, para que cada ser humano pudesse ser livre e por si descobrisse a melhor maneira de se realizar e ajudar a comunidade e o grupo social e étnico em que vive e em que somos todos diferentes e todos iguais nesta aldeia global.
Grande parte dos conflitos desapareceriam se todos tivessem ar, terra e água, casa e mesa, educação, trabalho e saúde. Os recursos seriam mais que suficientes. É por aí que deviam começar todos investimentos dos países e governos na condição humana e não faltaria que fazer durante umas largas décadas, sem medos, egoísmos mesquinhos e racistas, insegurança, preconceitos e muros. Pensemos só no desperdício escandaloso existente e em que seria tão fácil a todos alimentar se os homens em vez da guerra e da ganância, se empenhassem na paz, cooperação, diálogo e solidariedade.
Claro que todos os seres humanos são iguais e inteligentes, seja qual seja a sua cor e etnia, língua e credo desde que tenham ou vivam em circunstâncias iguais nesta curta peregrinação terrestre. Custa assim tanto admitir esta verdade que há milhares de anos devia estar assimilada e ser prática corrente e universal ou, pelo contrário, é T. Hobbes quem tem razão?…
Já esquecemos que o homo sapiens apareceu muito antes em África que em qualquer outra parte do Mundo?… Em África ou na Índia como na Arábia ou no Turquemenistão são iguais as potencialidades de acesso ao saber e conhecimento?
Os homens guerreiam-se desde sempre com ou sem causas justas e são eles os responsáveis pela liquidação de milhares de espécies na linhagem dos animais para exibir os cornos nas salas de jantar ou as unhas de leão e oferecer as peles de leopardo às suas dondocas, mas deviam usar as faculdades que têm para o entendimento e a compreensão do direito à vida que todos têm sem esquecer as árvores nossas amigas.
Para quê tantos automóveis, armamento, perfumes, óculos e sapatos, telemóveis e computadores?
Vive-se, luta-se e nada de resultados em termos das sociedades, como muito bem denuncia aquela prodigiosa menina Greta Thunber. Tudo recomeça, a meu ver, pela manifesta incapacidade crónica na transmissão às gerações mais jovens do que mais interessa realmente na existência, com particular incidência no mundo ocidental, onde o culto do efémero e de distração coletiva campeiam e as desigualdades se acentuam vergonhosamente, fatura que alguém pagará mais tarde ou mais cedo.
Alguém poderá imaginar o nada em vez do Universo? E que sentido ou limite tem o nada ou o vazio? É difícil imaginá-lo como não é fácil encontrar uma boa teoria cosmológica para percebermos como tudo começou, pois nem o “big bang” e muito menos Darwin encerram o problema em aberto. E se até hoje os homens de Ciências continuam a procurar, debater e teorizar, quando penso ao longo da história da ciência e da filosofia nos modestos contributos a que chegaram sobre as formas de governação dos países e dos homens, quem somos nós para resolver melhor semelhante imbróglio, depois de Platão, Tomás de Aquino, Galileu, Copérnico ou Kepler e Einstein?…
Improvável, mas aqui e ali mulheres têm conseguido com sabedoria colocar as mãos na massa e com reconhecido sucesso de políticas humanistas. Para que este mundo fosse governável era preciso virá-lo do avesso e refazê-lo na linha do que sobre isto escreveu Camus, se os homens resolvessem sentar-se à mesa e decidissem como seres racionais, que raramente acontece como sabemos.
A irracionalidade é comum, mas o inquietante é ela começar a espalhar-se em grande escala. As nações têm ido longe demais por caminhos ínvios e em que é preciso voltar atrás. Refiro-me às alterações climáticas, à usura de uns quantos descarados predadores contra a fome e falta de saúde da grande maioria e ao desperdício de bens indispensáveis ao bem-estar coletivo, que as feridas da escravatura e do colonialismo sangram ainda por aí.
Para quê tantos automóveis, armamento, perfumes, óculos e sapatos, telemóveis e computadores? Não são basicamente todos parecidos? Porque desperdiçar tanta matéria-prima em luxos desnecessários e aberrantes como os Rolls, os jatinhos ou os Ferraris e outras bugigangas para adultos excêntricos?…
No final da corrida existencial precisamos todos apenas de dois escassos metros de terra para enterrar os nossos sonhos, ossos e vaidades. Vamos nus tal como nascemos e o único troféu que podemos levar é o bem que fizemos aos outros.
Não seria melhor simplificar e distribuir todos esses bens civilizacionais por todos os cidadãos do mundo, movidos a força eólica ou hidrogénio? Pensar em habitação decente para todos em vez das favelas e bairros de lata que embrulham as grandes cidades, enfim, computadores para todas as crianças a par da escola e da saúde?
Corremos tanto atrás de quê? Porquê e para quê?! … No final da corrida existencial precisamos todos apenas de dois escassos metros de terra para enterrar os nossos sonhos, ossos e vaidades. Vamos nus tal como nascemos e o único troféu que podemos levar é o bem que fizemos aos outros.
O que faz correr o esfíngico Xi Ji Ping como uma perigosa hidra de Lerna por toda a parte não lhe chegando os problemas que já tem para resolver; big brother orwelliano que ele já é há muito pela vigilância digital e que nada quer dos ensinamentos de Confúcio ou Laotzé, e compadre de outro troglodita que sonha ainda em ser czar com dentes de Drácula e restaurar o velho e vasto império e continuar com os muros vergonhosos de Berlim, Polónia, Ucrânia, Crimeia e outros aprendizes de feiticeiros como a Hungria e Turquia…
Bom era correr menos e pensar mais nos outros e no Mar e na Mãe natureza, em paz com a família e com os amigos, pois que a existência individual acarreta já problemas que chegam e sobram para qualquer governo e para cada ser humano que pisa este planeta ameaçado por toda a horda de malfeitores e bandoleiros deste mundo inacabado e meio maluco em que vivemos há tantos milhões anos!…
Mesmo assim, pasme-se!, pois se viver é um grande risco e que o relatem os vizinhos de Tanguska, Hiroshima, Pearl Harbour e Saigão, o Holocausto e Verdun, o 11 de Setembro em NY, Bucha e Mariupol… é, em boa verdade, o maior e o melhor bem, sempre, claro, entre os trabalhos hercúleos de Sísifo e um indomado e resiliente Prometeu, entre as teias, artimanhas e ciladas da existência entre Cila e Caríbdis.
É da condição humana e do ofício de viver, para quem não aceita tomar as sombras fagueiras da alegoria da caverna pela realidade crua, infernal e dura que a todos nos envolve.
_______________________________________________
Os artigos de opinião publicados no NOTÍCIAS DE FAMALICÃO são de exclusiva responsabilidade dos seus autores e não refletem necessariamente a opinião do jornal.
Comentários