A imigração em Portugal não é apenas um fenómeno demográfico; é um verdadeiro teste à capacidade de uma sociedade historicamente moldada pela emigração de se tornar, ela própria, uma terra de acolhimento. Em 1960, apenas 29 mil estrangeiros residiam no país, a maioria espanhóis e brasileiros. Hoje, mais de um milhão de imigrantes escolheram Portugal como lar, representando cerca de 11% da população residente. Essa transformação traz à tona desafios essenciais, como a integração, o respeito pelas diferenças culturais e o combate ao preconceito.
O crescimento acelerado da imigração, especialmente após 2015, reflete uma dinâmica global de mobilidade, mas também impõe desafios consideráveis. Um estudo recente, intitulado ‘Barómetro da Imigração – A Perspectiva dos Portugueses’, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, revela percepções contraditórias sobre a imigração. A maioria dos inquiridos apoia o direito de voto, o reagrupamento familiar e a naturalização dos imigrantes, reconhecendo o valor cívico e humano dos migrantes. No entanto, essa aceitação legal esbarra em uma rejeição cultural que aponta para uma sociedade dividida entre os valores de igualdade e as percepções de ameaça.
Um dos principais fatores que alimentam atitudes negativas é o enviesamento na percepção do número de imigrantes em Portugal. Grande parte da população superestima significativamente a dimensão da imigração, alimentando receios infundados e reforçando posturas adversas. Essa distorção não apenas distorce o debate público, mas também influencia negativamente as políticas públicas, que frequentemente buscam apaziguar ansiedades sociais em vez de responder a realidades concretas.
Esse medo é, em grande parte, alimentado pela desinformação. O estudo aponta um desvio significativo na percepção do número de imigrantes, frequentemente superestimado. Quanto mais as pessoas acreditam que “há demasiados imigrantes”, mais negativas se tornam suas opiniões. A responsabilidade por essa distorção recai não apenas sobre a sociedade em geral, mas também sobre os meios de comunicação e os líderes políticos, que devem desmistificar essas falsas narrativas. Ignorar a realidade dos dados em favor de discursos de ódio ou medo é um erro que enfraquece a coesão social.
Apesar do crescimento do número de imigrantes e da complexidade do fenómeno, as políticas públicas em Portugal ainda são insuficientes para mitigar as tensões sociais e promover uma integração eficaz. As campanhas para desmistificar falsas percepções são quase inexistentes, e a falta de mecanismos robustos para apoiar a convivência intercultural contribui para a perpetuação de divisões sociais.
Entretanto, há sinais de esperança. Aqueles que reconhecem a contribuição económica dos imigrantes — seja para a Segurança Social, seja para a revitalização de sectores-chave como a agricultura, a saúde e a tecnologia — tendem a ter opiniões mais favoráveis. Além disso, aqueles que possuem maior confiança no próximo são geralmente mais abertos à diversidade e ao multiculturalismo. Isso sublinha a importância de reforçar os laços de confiança, combatendo ativamente o discurso do medo com uma visão baseada na razão e na solidariedade.
Portugal enfrenta uma escolha crucial: pode recuar diante dos desafios ou pode liderar com visão e coragem. A imigração é uma oportunidade para renovar a economia, enriquecer a cultura e, acima de tudo, reafirmar o compromisso com a dignidade humana. O futuro não se constrói com muros, mas com pontes — e cada um de nós tem um papel essencial nesse processo.
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