O abate de centenas sobreiros e milhares de outras árvores numa zona florestal na confluência das freguesias de Calendário, Outiz e Vilarinho das Cambas para instalar uma central fotovoltaica num terreno equivalente a 80 campos de futebol significa mais uma cedência inaceitável da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão a interesses económicos predadores que apenas vão explorar o solo e comprometer o nosso ambiente.
Os terrenos em causa, na área envolvente ao outrora idílico monte de Santa Catarina – numa mancha florestal que podemos considerar como sendo a Amazónia famalicense –, acabaram de perder o verde das árvores. Trata-se de uma área que equivale a três vezes o Parque da Devesa.
Entre tantas localizações possíveis foi escolhido o “pulmão” do concelho. Terrenos alugados e íngremes quando seria mais fácil a instalação e manutenção de painéis em terrenos planos.
Curiosamente, uma outra empresa, com nome parecido e os mesmos sócios, também apresentou um projeto semelhante para o concelho de Valongo, mas não teve a mesma sorte: o projeto foi chumbado pelo município. Em Vila Nova de Famalicão, porém, os promotores encontraram a permissividade autárquica que procuravam.
Além dessa central, os mesmos promotores têm em andamento uma outra a instalar em Ribeirão. Há ainda outras empresas e outros processos a decorrer na Câmara de Famalicão. [ver aqui Centrais fotovoltaicas no concelho de Famalicão: quantas são, em que freguesias e área que ocupam]
A instalação da central fotovoltaica foi tratada no silêncio dos gabinetes. Os famalicenses ficaram a saber sobre a instalação de centrais fotovoltaicas no concelho através do NOTÍCIAS DE FAMALICÃO. [ver aqui Construção de centrais solares fotovoltaicas em Famalicão envoltas em mistério] Meses depois, já com o abate florestal em andamento, é que o assunto foi notícia em outros jornais.
Ao ter acolhido um projeto com implicações tão graves no meio ambiente, a Câmara Municipal de Famalicão ridicularizou o recurso ao interesse público municipal e abriu caminho a uma atrocidade em terrenos que integram a Reserva Ecológica Nacional. O que significa que, em Famalicão, tudo é possível fazer, inclusive, prejudicar o ambiente e o nosso futuro coletivo, desde que certas vontades se unam e a maioria todo-poderosa aprove.
A verdade é que o Município de Famalicão é o principal responsável pelo ordenamento do território local. E se a autarquia não tivesse recorrido à figura do interesse público municipal o projeto não sairia do papel.
Quando os famalicenses mais precisavam do sentido de responsabilidade dos autarcas que elegeram, a decisão da Câmara Municipal foi invocar o interesse público para legitimar um crime ambiental para satisfação dos mentores de um negócio.
A maioria PSD-CDS não pode sacudir a água do capote. E Paulo Cunha, o presidente que viabilizou o projeto, deveria explicar aos famalicenses que motivos tão fortes levaram a autarquia a sacrificar, mais uma vez, o meio ambiente em nome de um negócio, aparentemente, sem o impacto na economia local que o justificasse.
Sejamos claros: qual é o interesse público para a economia do concelho de um investimento que destrói uma área florestal de 80 campos de futebol para instalar uma “fábrica” de energia solar que vai gerar um ou dois postos de trabalho?
A Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão escolheu ficar do lado do investimento predador. Limpa as mãos como Pilatos, escudando-se na legalidade. E demonstra que não está do lado das populações, nem está interessada em defender o ambiente e a qualidade de vida no território do concelho.
O presidente Mário Passos, que na campanha eleitoral encheu a boca de “neutralidade carbónica”, esconde-se atrás da lei para justificar o abate massivo da floresta de Outiz. Ora, o facto de o projeto cumprir “todos os requisitos legais” e de ter “todos os pareceres favoráveis exigidos”, como argumenta, não pode legitimar o maior crime ambiental cometido em Famalicão no século XXI.
Com autarcas que fecham os olhos a estes desmandos, ou que se mostram impotentes para travar este tipo de atividades predadoras, é o concelho de Famalicão que perde valor e atratividade.
O monte de Santa Catarina é uma área verde emblemática em Vila Nova de Famalicão que ficou seriamente comprometida. Uma área que faz parte das memórias afetivas, da história e do lazer dos famalicenses. Uma área do bem comum do nosso território que deveria ser cuidada e protegida.
Infelizmente, parecem estar a faltar responsáveis autárquicos que tenham como divisa principal o serviço aos famalicenses e à defesa do bem comum. Lavam as mãos como Pilatos e tentam manter os cidadãos adormecidos. Só que nem todos estão a dormir.
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