Agostinho Fernandes, que foi presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão durante cinco mandatos consecutivos, entre 1983 e 2002, tece duras críticas à gestão ambiental da autarquia, liderada por Mário Passos, da maioria PSD-CDS.
O antigo autarca, que está fora da política ativa, insurge-se contra o abate de árvores na cidade de Vila Nova de Famalicão, “sem dó nem piedade, por homens armados de serrotes e tesouras”, critica os “maus-tratos infligidos” sobre o rio Pelhe e mostra-se “triste” com a ribeira de Talvai, que “cheira que tresanda regularmente”, antes de “enlaçar no Pelhe”, no Parque da Cidade. Tudo isto, diz Agostinho Fernandes, “apesar dos muitos milhões enterrados em infraestruturas de que ninguém quer saber ou manda fiscalizar e que todos pagamos”.
“ÁRVORES CORTADAS SEM DÓ NEM PIEDADE”
Edil durante cinco mandatos e 19 anos consecutivos, sempre eleito pelo Partido Socialista (PS), de que foi militante, Agostinho Fernandes, atualmente com 81 anos de idade, é o presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão que mais tempo esteve em funções, desde 1935, quando o município foi criado. Por isso mesmo, as suas opiniões sobre o concelho têm um significado político que não deve ser ignorado.
O ataque lançado à política ambiental do município surge num artigo publicado por Agostinho Fernandes na edição do “Jornal de Famalicão” desta quinta-feira, 25 de maio, onde o antigo autarca é colunista regular.
O artigo, sob o título “O Que Vai pelo Mundo…”, destaca um acontecimento mundial, um acontecimento nacional e um acontecimento local. É neste último capítulo que Agostinho Fernandes carrega nas teclas ao lembrar que as árvores que ele mandou plantar nas décadas de 1980 e 1990 nas ruas da cidade, nos últimos tempos, “começaram a cair, a serem cortadas sem dó nem piedade por homens armados de serrotes e tesouras, na pior altura do ano, em plena primavera”. E o antigo presidente da Câmara questiona: “Haverá razões?”
E, com algum sarcasmo, Agostinho Fernandes, vai enumerando as razões em forma de pergunta: “Para plantar outras e substituir de imediato? Porque danificam as infraestruturas? Porque os cidadãos se queixam que ensombram a casa ou o quintal? Enfim, sem comentários… Porque são feias e abrigam os amigos passarinhos que as escolhem para pernoitar, mas sujam os queridos automóveis?”
“ONDE ESTÁ A ÁRVORE MAIS ANTIGA?”
O tom é corrosivo e o recurso à literatura torna a crítica ainda mais contundente. Tanto mais que Agostinho Fernandes puxa a “fita” do tempo atrás para lembrar o que encontrou na vila famalicense quando tomou posse como presidente da autarquia, em 1983: “Há anos não havia ou havia poucas árvores pela cidade e as que ainda resistiam pela cidade eram genericamente do tempo de Benjamim Salgado [NdR: presidente da Câmara Municipal entre 1965-1969] ou de particulares ou ainda do Jardim da Câmara Municipal, idealizado como o edifício pelo grande arquiteto Januário Godinho”.
Valorizando o seu trabalho como autarca, Agostinho Fernandes lembra a sua aposta na arborização urbana: “Plantaram-se muitas, entretanto, na década de 1980 e cresceram bem como se pode verificar (…). Agora dão nas vistas…”
Agostinho Fernandes lembra ainda que “alguns cidadãos e autarquias classificam as mesmas árvores e valorizam-nas, conferem títulos de antiguidade”. E “cidadãos há que as mimam e cuidam delas até na proximidade de seus parques. E o que acontece entre nós?”, pergunta, sem nunca se referir diretamente à Câmara Municipal e ao seu atual presidente Mário Passos.
No entanto, o antigo presidente da Câmara não deixa de lançar um desafio curioso aos autarcas da Câmara Municipal e das freguesias: “Onde estará a árvore mais antiga da cidade, do concelho e de cada freguesia?”, pergunta Agostinho Fernandes, deixando, assim, “uma pista de muito trabalho para os jovens ambientalistas e não só, em vez do blá, blá, blá… em moda”.
No artigo, Agostinho Fernandes refere-se à “acácia do Jorge em S. Miguel de Ceide, um dos maiores ícones da terra e que Camilo imortalizou em belo soneto” e à “árvore florida do nosso Nobel da Literatura”, que o próprio José Saramago plantou na Praça de Álvaro Marques, em 1998.
“DEVE SER DO MEU NARIZ!…”
Agostinho Fernandes – que recentemente esteve ao lado Armindo Costa ao colocar a sua assinatura num documento contra a intervenção urbanística que a Câmara Municipal projetou para os terrenos das traseiras do Hospital – mostra-se ainda preocupado com o “estado moribundo” em que se encontra o rio Pelhe, “em resultado dos maus-tratos infligidos desde a sua origem, em Portela, até ao seu encontro com o Ave, em Lousado”.
“É triste, mas verdade, se até o riacho encanado em Sinçães, e por trás das Lameiras, cheira que tresanda regularmente, naqueles poucos passos antes de enlaçar no Pelhe… Mas deve ser do meu nariz!…”, ironiza o antigo autarca famalicense, que deixou a militância do Partido Socialista depois da rotura com a fação do então seu vereador Fernando Moniz, em 2001, o que abriu caminho à vitória da coligação PSD-CDS, ainda hoje no poder municipal.
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