Falar de construção sustentável exige levar o pensamento muito mais além que, exclusivamente, pensar em materiais com pegada ecológica reduzida ou eficiência energética. Impele-nos a repensar todo um modelo económico, organizacional, formativo e de ordenamento do território. Não me prendo nas questões técnicas dos processos, que ultrapassam o meu conhecimento, mas focando as coisas básicas, é correto dizer que existem pontos que o mais comum do cidadão já assimilou. As alterações climáticas não são coisa de extremistas, o futuro das novas gerações está em causa e as ações no terreno “eram para ontem”, pelo que a forma como estamos a construir as nossas cidades tem de ser repensada.
E se se exige a mudança de paradigma em relação à forma como se constroem cidades, falta saber quem terá a coragem de arregaçar mangas e iniciar a “obra”. Pois, continuar a ignorar que não temos a responsabilidade de agir, ou que as políticas atuais vão dar resposta aos desafios que temos em mãos, só mesmo acreditando em milagres.
Recentemente a Câmara Municipal iniciou, segundo dizem, uma série de conferências com vista à criação de uma “estratégia de promoção da sustentabilidade” – seja lá isso o que significa no dicionário camarário. A primeira sessão, dedicada à construção sustentável, teve um painel de ilustres convidados.
Uma coisa é certa, os oradores não se inibiram de chamar as coisas pelos nomes. Desde o apontar para a falta de conhecimento e formação de arquitetos, engenheiros e outros técnicos sobre o que é uma construção sustentável, à necessidade de se operarem as adaptações necessárias, no âmbito de ensino superior, atendendo que este continua a direcionar (formatar) para a construção convencional, ou até a exigência de se pensar a ecologia no planeamento, assumindo-se que precisamos de territórios regenerativos. Diria que só mesmo os mais indiferentes – que porventura ali estariam obrigados – não ficaram cativados com as intervenções.
Devo confessar que assistir a estas visões sobre o território, onde se incluem a criação de bosques e hortas urbanas, que os edifícios sejam nZEB (nearly-zero energy building), ao que acresce a forma como aproveitamos, ou não, as nossas reservas de água, ou até perante afirmações de que o conhecimento científico existe, as alternativas estão disponíveis, apenas falta a vontade (política, empresarial), atribui um significado especial ao trabalho que, nomeadamente, o PAN Famalicão tem feito nesta matéria.
E aqui é bom lembrar que já em 2019 sugerimos que o quiosque da Praça D. Maria II fosse um edifício nZEB, contudo, e lamentavelmente, a única coisa que sabemos, até ao momento, é o número de vezes que o mesmo foi demolido e, pelo que se vê, será mais um bloco de cimento. Mas também quando temos um espaço como o Mercado Municipal que resultou de uma requalificação recente e nem painéis solares foram instalados, está tudo dito, em matéria da (míope) visão ecologista do executivo.
Também, não posso deixar de referir as palmadinhas nas costas que a Câmara Municipal recebeu pelas placas nos jardins a alertar para a importância dos polinizadores e proteção da biodiversidade, ora, não esqueçamos que esta questão fica restringida ao centro urbano e que, com exceção de Delães e Vermoim, a prática (errada) do uso de herbicidas é o método adotado por todo o concelho, apesar de, uma vez mais, o PAN insistir, constantemente, neste tema.
Resta-nos esperar pelas próximas sessões que possam vir deste anunciado “interesse” camarário para promover a sustentabilidade, que as mesmas ocorram num horário acessível à maioria dos famalicenses, e que não passe de um encontro discreto, quase que condicionando a participação de todos e todas e que permita uma efetiva discussão sobre o verdadeiro interesse público, sendo que as provas dadas até ao momento, tudo ficará na gaveta da sustentabilidade acumulando o pó da resistência.
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